Mostrar mensagens com a etiqueta Golden Era. Mostrar todas as mensagens
Mostrar mensagens com a etiqueta Golden Era. Mostrar todas as mensagens

Um pouco de história (conclusão)

Em 1938 entrou em vigor uma nova fórmula que limitava os motores a 4500c.c para motores normalmente aspirados e 3000c.c. para motores equipados com compressores. Foi este o caminho seguido pela Mercedes com o novo W154 e pela Auto Union com o Type D cuja grande diferença para o Type C era estar equipado com um novo motor V12 com 2990c.c., equipado com dois compressores Roots que lhe permitiam atingir os 485hp. Visto de frente é fácil detectar as duas bossas que nasceram na carroçaria devido aos compressores. O Type D apresentava também uma traseira mais esguia e uma nova suspensão baseada num eixo De Dion.

No entanto o ano ficou marcado pela morte do seu piloto n.º 1 Bernd Rosemeyer logo em Janeiro, com apenas 28 anos, quando tentava estabelecer um novo record terrestre de velocidade, na autoestrada entre Frankfurt e Darmstadt. A Auto Union pretendia fazer nesse dia algumas tentativas para estabelecer um novo record e para isso tinha reservado o troço de auto-estrada. Qual não é o espanto dos técnicos e Rosemeyer quando, enquanto descarregavam o carro e preparavam tudo, vêm chegar os camiões da rival Mercedes-Benz, que sabendo dos planos da Auto Union não quiserem ficar atrás. Estava preparado o terreno para uma batalha entre os dois grandes construtores do regime nazi. Rosemeyer fazia uma tentativa, a seguir tentava o rival Caracciola. Na sua segunda tentativa Caracciola marcou um novo record a 432 km/h. No regresso, vendo Rosemeyer a pronto para mais uma tentativa, aproximou-se e avisou-o que quase tinha perdido o controlo do carro, pois os ventos estavam demasiado fortes e seria muito perigoso continuar. Provavelmente Rosemeyer pensou que o seu rival apenas pretendia desencorajá-lo para proteger o seu record, pelo que se lançou numa nova tentativa, enquanto do lado da Mercedes já se arrumava o material para o regresso. Quando se viu uma espiral de fumo uns quilómetros mais à frente e não havia resposta dos mecânicos que estavam no final do troço percebeu-se que algo tinha corrido mal. Quando chegaram ao local apenas encontraram os destroços do Type D por entre a floresta que ladeava a Autobahn. Os fortes ventos, potenciados por uma clareira, terão atirado o carro para a esquerda, o piloto terá tentado compensar, com o carro a guinar fatalmente para a direita e entrar em carambolas quando atingiu as berma e embrenhando-se entre as árvores. O corpo de Rosemeyer foi encontrado na berma do actual quilómetro 508 da Autobahn 5, no sentido Franfurt-Heidelberg, onde está erigido um memorial a evocar o virtuoso piloto.


Esta derradeira versão carenada (Streamliner) do P-Wagen apresentava outra inovação, os engenheiros da Auto Union, já sem Ferdinand Porsche, perceberam que podiam aproveitar o fluxo de ar que passava por debaixo do carro para criar um efeito de sucção que empurrava o carro para o asfalto. Tirava-se assim, pela primeira vez, partido do “efeito solo”, de forma deliberada, 40 anos antes do fabuloso Lotus 79.

Com a morte Rosemeyer a Auto Union contratou outro grande talento da época, o italiano Tazio Nuvolari, campeão europeu em 1932, que até aí se tinha mantido fiel à pátria, correndo sempre nos ultrapassados Alfa Romeo. Il Mantovano Volante triunfou em Itália e em Donington, enquanto os restantes pilotos se remeteram ao anonimato, salvando-se o título europeu de montanha para Hans Stuck.

Em 1939 Nuvolari triunfou na Jugoslávia e ficou em segundo no Eifel, Herman Muller ganhou em França e ficou em segundo na Alemanha, Rudolf Hasse ficou em segundo na Bélgia e Georg Meier ficou em segundo na França. Quando a Segunda Guerra Mundial a iniciar-se, não é claro quem terá sido o campeão desse ano, pois há dúvidas sobre qual o sistema de pontuação em vigor, pois tinha sido incumbido ao representante da Bélgica para propor um novo sistema, não sendo claro se este chegou a entrar em vigor ou não até à erupção da guerra, com o equivalente ao Automóvel Clube Alemão a decretar, com publicação no jornal oficial do Partido Nazi que o Campeão seria Hermann Lang da Mercedes-Benz, mas pelo sistema “antigo” seria Hermann Muller a sagrar-se campeão. Mas por esta altura a invasão da Checoslováquia concentrou as atenções da Europa e esta disputa nunca foi resolvida.

A erupção da guerra levou ao fim dos Grandes Prémios por quase dez anos e foi mesmo o fim da linha para as pérolas da Auto Union e da Mercedes e acima de tudo a Golden Era dos Grandes Prémios.


Um pouco de história (continuação)

A temporada de 1935 marcou o crescimento do motor do P-Wagen para 5000c.c. e a potência subia para 370hp, nascendo ao Type C. Para este ano o italiano Achille Varzi juntou-se a Hans Stuck e à nova estrela Bernd Rosemeyer na equipa de Grandes Prémios. Hans Stuck venceu o Grande Premio de Itália, foi segundo no Grande Premio da Alemanha e voltou a triunfar em grande escala nas rampas, onde era um verdadeiro especialista, o que lhe valeu a revalidação do título europeu. O recruta Achille Varzi venceu o Grande Premio de Tunis além da Coppa Acerbo e ficou em segundo lugar no Grande Premio de Tripoli venceu na Republica Checa, ficando em segundo no Grande Premio do Eifel e na Coppa Acerbo. Para completar mais uma época de sucessos o chefe de fila Hans Stuck juntou mais um record ao curriculum do P-Wagen.. Numa autoestrada italiana atingiu a velocidade máxima para um automóvel até então, 320 km/h, num P-Wagen com aerodinâmica refinada, como o cockpit fechado, fazendo lembrar um cockpit de um caça, rodas traseiras carenadas, tampões nas rodas dianteiras, carenagem das suspensões/semieixos e parte da grelha do radiador.



No final deste ano surge mais uma inovação de Ferdinand Porsche. Para reduzir as referidas dificuldades em controlar o eixo traseiro foi desenvolvido em conjunto com o fabricante de transmissões ZF o primeiro diferencial autoblocante usado num automóvel.


Mas tal não era suficiente, com o desenvolvimento constante da rival Mercedes, que consagrou Rudolf Caracciola campeão europeu de Grandes Prémios em 1935, a Auto Union não podia parar. Assim, para 1936 o propulsor voltou a crescer, desta vez para os 6000c.c. e a potência para 520hp. Foi um ano de domínio total do Type C. Rosemeyer venceu nos Grandes Prémios do Eifel, Alemanha, Suíça e Itália, a que juntou a Coppa Acerbo e o segundo lugar, o que lhe valeu o campeonato europeu de Grandes Prémios a que juntou igual título na Montanha, que “roubou” a Hans Stuck. Achille Varzi ganhou em Tripoli e somou segundos lugares no Mónaco, Milão e Suíça enquanto Hans Stuck ficou em segundo lugar em Tripoli e Alemanha, enquanto Ernst von Delius ficou em segundo lugar na Coppa Acerbo.

Entretanto Ferdinand Porsche, cada vez mais ocupado com o projeto “Carro do Povo”, deixou o projecto P-Wagen, ficando o resto da equipa técnica encarregue do carro.

Por isso, sem surpresa, os Type C não apresentaram grandes evoluções enquanto a Mercedes-Benz correu com o novo W125. Ainda assim Rosemeyer triunfou nos Grandes Prémios do Eifel e Donington, na Coppa Acerbo e na Vanderbilt Cup, ficando em segundo em Tripoli. Rudolf Hasse ganhou o Grande Premio Belga secundado por Hans Stuck, enquanto Ernst von Delius ficou em segundo lugar no Grande Premio de Avus. Ainda assim a Auto Union e o Type C foram batidos em vitórias pela Mercedes-Benz e o seu novo W125 (7-5) e Rudolf Caracciola reconquistou o ceptro europeu.



Um pouco de história

Provavelmente o carro mais inovador da história da Fórmula 1 não foi o Lotus 78 com o seu efeito solo, nem o Brabham BT44 com o ventilador, nem o McLaren MP4/4 com o chassis totalmente em fibra de carbono.

Provavelmente o carro mais inovador da história surgiu muitos anos antes. Em 1935 o Dr. Ferdinand Porsche concebeu no seu gabinete de projectos um monolugar para a Auto Union, denominado Auto Union P-Wagen, completamente revolucionário para a época.

Até 1933 os Grandes Prémios eram dominados pelos construtores italianos como a Alfa Romeo, Bugatti e Maserati. Estando a indústria automóvel pouco desenvolvida a busca de performance obtinha-se com motores maiores e mais potentes, beneficiando da evolução dos motores, principalmente devido à indústria aeronáutica. Com a escalada de potência, associada ao aumento de peso dos motores, os acidentes fatais sucediam-se, pelo que a AIACR (Associação Internacional dos Clubes Automóveis Reconhecidos), que regulava os Grandes Prémios na Europa, decidiu limitar o peso máximo dos monolugares a seco a 750kg, o que pela tecnologia e materiais da época limitaria a cilindrada dos motores a 2500 cm3 segundo estimativa da AIACR.

Porém estávamos no apogeu do regime nazi que procurava demonstrar a supremacia ariana através do desporto automóvel também, subsidiando os programas desportivos dos dois grandes construtores alemães de então, a Mercedes-Benz e a Auto Union. Criavam-se assim ídolos alemães para as massas na figura dos pilotos e demonstrava-se a supremacia tecnológica dos seus engenheiros.

Assim Porsche, que pertencia à AIACR e assim influenciou os novos regulamentos projectou e a Auto Union construiu, recorrendo a materiais exóticos para a época, só ao alcance de uma equipa subsidiada pelo Reich, um monolugar dentro do peso máximo, com o depósito de combustível atrás do banco do piloto e atrás deste um motor V16 de 4400 cm3 debitando 295 hp. Sim, mais de 25 anos antes da Cooper, já a Auto Union vencia corridas com um carro de motor central traseiro. Ferdinand Porsche já havia tentado anteriormente, em 1923 com o Benz Tropfenwagen, um projecto abandonado prematuramente então.

Além disso o chassis tubular pesava apenas 40 kg e a carroçaria de alumínio 50 kg. O facto do depósito se situar entre o piloto e o motor destinava-se a que o comportamento do carro não variasse muito com a diminuição de quantidade de combustível no depósito.

O motor V16 foi pensado para obtenção do maior binário possível em deterimento de alguma velocidade de ponta. Apesar de cerca de 35 hp menos potente que os Mercedes Benz o seu binário era fabuloso e disponível desde rotações muito baixas. Dizia-se até que tinha uma faixa de utilização tão ampla que podia fazer uma volta em qualquer circuito sem fazer nenhuma passagem de caixa.

Mas nem tudo foi fácil, a primeira barreira foi convencer Hitler a dividir o subsídio que este havia destinado à Mercedes em duas partes iguais, o que conseguiu numa visita do Fuhrer à fábrica da Auto-Union. Vencido o primeiro obstáculo em 1933 foi assinado o contrato entre Porsche e a Auto Union que era muito ambicioso, no mínimo, ou vejamos, os requisitos que teria que obedecer:

- O motor deveria desenvolver 250hp às 4500 rpm

- Deveria pesar no máximo 800kg sem pneus, gasolina, óleo e água, 750kg a partir de 1934 quando entrasse em vigor o novo regulamento

- Deveria percorrer ininterruptamente 10 voltas no circuito de Avus, alcançando 250km/h.- Seria considerado completamente entregue quando vencesse à geral uma corrida internacional

Nascia assim o P-Wagen (Porsche-Wagen) que a 12 de Janeiro de 1934 já cumpria os 3 primeiros requisitos. No final do mês era capaz de correr ininterruptamente 40 voltas no circuito de Avus.

A 6 de Março de 1934 o Auto-Union P-Wagen batia os primeiros recordes mundiais de velocidade. Com Hans Stuck ao volante bateu o recorde da hora (217,110Km/h), o recorde de 200km (217,018 Km/h) e o recorde das 100milhas (216,875Km/h).

Uma ideia que foi abandonada ainda no início do desenvolvimento foi o de aproveitar o chassis tubular para conduzir o fluido de refrigeração do radiador, na frente até ao motor na traseira, pois os pilotos queimavam-se constantemente quando tocavam nos tubos escaldantes.

Apesar de menos potente que o Mercedes-Benz da época, era bastante mais eficaz equilibrando assim o deficit de potência e repartindo vitórias por toda a Europa em Grandes Prémios e em provas de rampa, de grande importância então.

Na realidade o carro foi definitivamente demasiado revolucionário para a época, principalmente para pneus arcaicos e suspensões desse tempo. Os pneus não transmitiam a aderência necessária pois os esforços de tracção aliados ao maior peso no eixo traseiro eram demais para as construções e borrachas existentes e as suspensões não conseguiam transmitir uma boa sensibilidade da traseira ao piloto, aliadas ao facto deste estar muito chegado à frente, não lhe permitia perceber quando a traseira derrapava em demasia. Este comportamento não seria tão imprevisível quanto isso, simplesmente os pilotos não estavam habituados a tal configuração mecânica. Nas provas de rampa chegou-se mesmo a uma solução curiosa, com rodados duplos para facilitar a pilotagem nas estradas mais estreitas e sinuosas.


O carro era muito difícil de pilotar e fácil de perder a traseira a cada curva. Por isso, apesar de diversos pilotos terem alcançado vitórias ao seu volante, apenas dois dos maiores pilotos de todos os tempos conseguiram tirar o máximo do carro: Bernd Rosenmeyer e Tazio Nuvolari.

O carro foi pilotado em 1934 por Hans Stuck, vencendo o campeonato alemão de montanha e três Grandes Prémios (Alemanha, Suiça e Rep. Checa, não havia então nenhum campeonato para Grandes Premios), debatendo-se com o comportamento difícil mas aproveitando a excelente aceleração (o maior peso da traseira facilitava na hora do colocar os cavalos no asfalto) e velocidade de ponta (a aerodinâica era outro dos pontos fortes do carro de motor central traseiro). No final do ano teve ainda tempo para regressar a Avus para bater mais cinco recordes (1km, 1 milha, 50km, 50 milhas, 100km, arrancando de uma posição estática)

(continua)